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Foto do escritorLuciana Ribeiro

Retrospectiva -Entrevista com Desirée Ruas para o Blog Ecopedagogia


Por Luciana Ribeiro


A Infância e o Consumo, a publicidade infantil e as ações pedagógicas que valorizam a cidadania ambiental no Brasil


Data: 14/11/2016 - postagem no Blog Ecopedagogia/Retrospectiva


Desirée Ruas – é uma Jornalista, especialista em Educação Ambiental e Sustentabilidade. Criadora do Movimento Consciência e Consumo, de Belo Horizonte (MG), ela faz parte da Rede Brasileira Infância e Consumo, Rebrinc (fonte: Rebrinc - http://rebrinc.com.br/) Desirée Ruas atua na comunicação e mobilização da Rebrinc que vislumbra a implementação de projetos que polemizam a importância das brincadeiras e do consumo sustentável; além disso, os canais pedagógicos priorizam a divulgação de artigos, de entrevistas e de publicações acadêmicas que valorizam o zelo inerente à cidadania que precisa ser vivenciada pelas crianças, pelos adolescentes e pelas famílias brasileiras.


Com muito carinho e com muita honra pedagógica, convidei a jornalista para dialogar sobre as angústias, os anseios humanos e sobre alguns dos projetos educativos que recomendam a inserção das políticas públicas no Brasil, portanto, carecendo da nossa ajuda, do apoio dos especialistas, dos empresários, dos pesquisadores, dos gestores públicos para reverem a posição das empresas, das indústrias e das instituições que lidam com as questões capitalistas, mas que de fato, na sua maioria têm menosprezado a saúde do homem e do planeta Terra.


Neste caminho reeducador, Desirée Ruas tem atuado com amor e consciência pedagógica para confrontar, protestar e colaborar com todos que fazem parte desse triste e complexo cenário, retrato da realidade social, econômica, cultural e ambiental do nosso Brasil, inclusive, uma situação enfrentada em várias partes do mundo. Segue a entrevista com ela:


Luciana Ribeiro: O que a Rebrinc faz pela infância no Brasil por meio da publicação das pesquisas acadêmicas, das discussões realizadas com a participação dos pais e dos cidadãos em geral nas palestras? Existe algum acordo político e pedagógico por meio dessa mobilização social que moraliza o Estatuto da Criança e do Adolescente?


Desirée Ruas : A Rede Brasileira Infância e Consumo – Rebrinc foi criada em 2013 e desde então ela reúne pessoas, organizações e movimentos relacionados à causa do consumismo infantil. Sua missão é “ser uma Rede capaz de despertar a sociedade, especialmente a comunidade escolar e os que produzem conteúdo nas mídias, para as consequências do consumismo na infância”. Por aglutinar educadores, pesquisadores e estudantes das áreas da infância e do consumo, a Rebrinc contribui para divulgar importantes pesquisas e iniciativas que questionam o incentivo ao consumo que, sabidamente, tem um impacto negativo sobre as crianças e os adolescentes. Nós também mobilizamos pais e mães tanto no mundo virtual quanto no mundo real pois sempre realizamos encontros e rodas de conversa para refletir sobre a educação nos dias de hoje. Enquanto a mídia incentiva o consumo e valores materialistas, precisamos nos unir para questionar o que tem sido oferecido para nossas crianças. Quanto ao Estatuto da Criança e do Adolescente, o que vemos é um distanciamento entre a teoria e a prática já que são muitos os desrespeitos diários aos direitos estabelecidos pelo ECA. Mas vemos também uma mobilização de grupos que contribuem para reforçar a importância de se divulgar e exigir o cumprimento dos artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente.


Luciana Ribeiro: Fale sobre o aniversário da Rebrinc que fez três anos no ano de 2016 e dos resultados pedagógicos que foram alcançados até o momento atual.


Desirée Ruas: 2016 foi um ano muito especial para nós da Rede Brasileira Infância e Consumo. Completamos três anos de existência e lançamos o movimento “Rebrinc pelo Brasil – Eventos Colaborativos pela Infância”. Realizamos de junho a agosto, feiras de troca, palestras e seminários que levaram para um público ainda maior a discussão da proteção da infância aos apelos para o consumo, da adultização, da importância do brincar... Discutimos alternativas para os educadores levarem para seus alunos em sala de aula, contribuindo para sensibilizar toda a comunidade escolar. Pais, mães, educadores e outros profissionais participaram de atividades em vários pontos do Brasil, como Belo Horizonte, São Paulo, Campinas, Porto Alegre e Brasília.


Luciana Ribeiro: Fale sobre a publicidade infantil que fere os direitos das crianças no Brasil e a forma como tem sido tratada pelos gestores públicos no Brasil. Poderia recomendar alguns conselhos para os estudantes de faculdades e de universidades poderem ajudar os cidadãos a manifestar seus sentimentos referentes às indústrias que ousam fazer as propagandas enganosas, inclusive, não resguardando e penalizando a saúde da criança e do adolescente?


Desirée Ruas: O Código de Defesa do Consumidor, no seu artigo 37, proíbe a publicidade abusiva. Dentre outros tipos, é abusiva a publicidade que faz uso da falta de experiência e julgamento da criança. Como a criança não tem condições de entender o que se esconde na publicidade, seus reais interesses, toda comunicação mercadológica que incentive a criança a consumir algo deveria ser proibida. Infelizmente, ainda temos comerciais e outras ações de marketing que tentam persuadir a criança para o consumo. Em 2014, foi publicada a Resolução 163 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Conanda. Ela reforçou esta proibição já que deu mais clareza para a identificação dos elementos que caracterizam a publicidade infantil. Há inúmeros movimentos, assim como a Rebrinc, que estão nessa luta, denunciando as ações ilegais e pressionando a indústria, as agências de publicidade e os órgãos do governo. Mas precisamos de mais pessoas engajadas. Os estudantes das universidades podem, por exemplo, pesquisar sobre o tema e produzir trabalhos acadêmicos que ajudem a sensibilizar a sociedade sobre os prejuízos da mídia e da publicidade sobre a infância. Quem está na mídia pode ajudar também produzindo conteúdo sobre o tema. O Sistema de Garantia dos Direitos das Crianças é formado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública e pelos Conselhos Tutelares, que devem ser acionados em caso de desrespeito aos direitos da criança. Saiba mais no site http://prioridadeabsoluta.org.br/denuncie/


Luciana Ribeiro: Poderia citar algumas publicações pedagógicas que servem como fundamento para estudos nas faculdades e para universidades brasileiras, democratizando as informações prioritários para os debates das políticas públicas que denunciam as armadilhas capitalistas, as quais ferem os direitos das crianças e dos adolescentes?


Desirée Ruas: Felizmente temos cada vez mais conteúdos que nos ajudam a entender a situação do consumismo infantil. E não são apenas livros, mas reportagens, documentários e até peças de teatro que levam à reflexão do tema. O livro “Crianças do Consumo – A Infância Roubada”, de Susan Linn, ajuda a entender a pressão do consumo sobre a infância. Muitas outras sugestões de leitura estão no site do Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana. O livro comemorativo dos 10 anos do Projeto Criança e Consumo também está disponível para download e vale a pena ser lido. (http://criancaeconsumo.org.br/publicacoes/)


Luciana Ribeiro: As famílias brasileiras carecem de esclarecimentos nas escolas para compreenderem como os malefícios da publicidade infantil, por exemplo, afetam as crianças por meio da obesidade infantil. Qual a sua visão crítica dessa realidade que tende a agravar-se no Brasil?


Desirée Ruas: A questão da alimentação é muito séria e envolve vários fatores. Atualmente, as famílias costumam ter menos tempo para preparar as refeições em casa. Não temos em todas as famílias uma divisão justa das tarefas domésticas. Vemos muitas mães sobrecarregadas com muitas atividades, dentre elas comprar e preparar os alimentos. Nesse contexto, a indústria dos alimentos ultraprocessados ganha cada vez mais espaço. O marketing é poderoso e promete aquilo que muitas famílias procuram: alimentos prontos ou de fácil preparo, com grande prazo de validade. Junto a isso, temos ainda os apelos para o público infantil como os personagens estampados nas embalagens. Muitos alimentos ricos em açúcar e gordura estão associados a personagens queridos pelas crianças. Enfim, os comerciais, as embalagens, as promoções são pensados para persuadir as famílias que vivem em um contexto que dificulta o cozinhar. Por isso, tanto o excesso de tarefas que costuma recair sobre as mulheres quanto o poder do marketing entram nesse cenário onde as crianças estão cada vez mais obesas e até com doenças crônicas não transmissíveis, DCNTs. Uma alimentação mais saudável depende de tempo e da opção pela “comida de verdade”. Quanto mais publicidade um alimento tem, menos saudável ele é. E as escolas também precisam repensar o que oferecem em suas cantinas e lanchonetes. Precisamos de um amplo debate sobre a alimentação nas escolas pois não podemos ter dentro de sala um incentivo à consciência na alimentação e na hora do recreio refrigerantes, bebidas açucaradas, salgadinhos e doces para a criança comprar. É necessário ter coerência, senão não adianta o esforço do educador.


Luciana Ribeiro: Poderia recomendar algumas atividades socioambientais que valorizam o debate das soluções pedagógicas que inserem o respeito pela criança, pelo adolescente e pelo meio ambiente?


Desirée Ruas: A interação do aluno com o ambiente em que vive é fundamental para que ele entenda a importância da natureza. E é a natureza pensada de uma forma ampla, sendo o aluno também parte dessa natureza. E a rua, o bairro, a cidade fazem parte deste meio ambiente. Acho que as escolas podem promover atividades como hortas, jardinagem, passeios pelo bairro para identificação de espécies, teatro, concursos literários, oficinas que permitam que as crianças possam refletir e ter contato com a terra, com sementes, com plantas etc. Para despertar nos alunos uma visão crítica sobre o futuro do planeta, o educador deve falar do trânsito, da poluição do ar, do lixo jogado na rua, da poluição das nascentes, da permeabilização do solo dos centros urbanos, dos desafios da mobilidade, dos projetos da Câmara dos Vereadores relacionados à saúde nas cidades, das ações do Prefeito, da forma como as construtoras estão engolindo as últimas áreas verdes das cidades e as mineradoras destruindo a paisagem e a água. Todas são questões urgentes e que se referem à vida nas cidades e falam sobre respeito: o respeito às gerações futuras. Afinal, o que estamos deixando para elas?


Luciana Ribeiro: Qual foi a motivação crucial que deu vida pedagógica para o site da Rede Brasileira Infância e Consumo? De que forma política visou-se a divulgação dele para os especialistas diversos e para os cidadãos brasileiros beneficiarem-se por meio dos conhecimentos socioambientais?


Desirée Ruas: Como a Rebrinc é uma rede, o seu processo é horizontal e colaborativo. A rede se constrói por meio de laços de confiança, sempre buscando garantir a inclusão de novas pessoas e ideias. E com a ajuda dos seus integrantes, a Rebrinc vai buscando mobilizar cada vez mais pessoas, falando sobre educação e mídia, alimentação saudável, combate ao consumismo infantil, combate à adultização da infância, educação para o consumo, educação para a sustentabilidade, dentre outros temas.


O site da Rebrinc, o grupo de discussão e a página no Facebook foram criados com o objetivo de promover a troca de informações e experiências entre todos os interessados nas temáticas criança e consumo. Recebemos artigos escritos por educadores, estudantes, pais, mães e pessoas de várias áreas de atuação. Todos buscam espaço para dar voz aos seus questionamentos e preocupações com a infância que hoje está tão mercantilizada e desrespeitada. Dialogamos com todos os interessados que nos procuram pedindo ajuda para pesquisas, projetos escolares e eventos da área. E assim vamos tecendo a nossa rede...


Luciana Ribeiro: Poderia falar sobre o computador e a criança? O que você acha da democratização da tecnologia no Brasil?


Desirée Ruas: Falando em direitos das crianças, sempre pensamos na questão do avanço da tecnologia. Ao mesmo tempo que ela nos permitiu acesso a experiências antes inimagináveis, seja no campo do lazer ou da educação, pensamos como as crianças estão viciadas em tais dispositivos. O questionamento que fazemos na Rebrinc é até que ponto o uso de tablets e celulares pelas crianças está tomando o lugar das brincadeiras criativas, das relações concretas e da movimentação física que são tão necessárias para o desenvolvimento delas. É importante que a gente tenha cada vez mais democratização do acesso às tecnologias mas precisamos ficar atentos às crianças e aos adolescentes no que se refere ao tempo que ficam conectados e ao conteúdo que estão acessando. Vemos hoje crianças e adolescentes tendo acesso a conteúdos adultos o tempo todo, em casa ou na escola. E nós, adultos, sem saber como proteger os filhos e alunos de tais conteúdos. É um desafio para pais, mães e educadores.


Luciana Ribeiro: Fale sobre a parceria que existe entre a Rebrinc e o Instituto Alana (http://criancaeconsumo.org. br/) que também publica estudos acadêmicos e os debates acerca das políticas públicas que respeitam a infância no Brasil.


Desirée Ruas: Existem muitos grupos, movimentos e instituições que trabalham pela proteção dos direitos da infância no Brasil. Para potencializar e aumentar sua escala e efetividade, muitos deles se articulam formando redes. Sobre os temas infância e consumo também encontramos muitos atores sociais interessados em dialogar e alguns movimentos e organizações já empenhados na causa. Mas não tínhamos ainda uma rede com o foco na proteção da criança aos apelos do consumo. Pensando nisso, em junho de 2013, um grupo de quase 50 pessoas se reuniu para dar início à formação da Rede Brasileira Infância e Consumo. O convite foi feito pelo Instituto Alana, organização que trabalha pela infância e desenvolve o projeto Criança e Consumo que existe há dez anos. O processo de construção da Rebrinc contou com algumas reuniões presenciais e com o apoio decisivo do Instituto Alana, que também faz parte da Rede. Especialistas e interessados nos temas infância e consumismo, que já participavam do Projeto Criança e Consumo, ajudaram a construir a Rebrinc. O trabalho do Instituto Alana, que concentra diversos projetos, é incrível e nos inspira a buscar novas formas, ações e linguagens pela defesa da infância.


Luciana Ribeiro: Como você vê a questão do envolvimento das famílias na construção de uma consciência que proteja a infância dos malefícios do consumismo?


Desirée Ruas: É fundamental pensarmos a criança e o consumo dentro do seu contexto familiar. Se os adultos de uma família consomem sem consciência, desperdiçando recursos e dinheiro, se endividando e dando uma importância para a acumulação de bens em detrimento de outras ações mais conscientes, essa criança vai aprender com esses exemplos. Dessa forma, é crucial um trabalho amplo, que envolva as escolas, a mídia, as comunidades repensando questões como trabalho, dinheiro, qualidade de vida e avaliando o que o ser humano tem vivido para manter o nível de consumo que a sociedade definiu como normal. É um desafio imenso, que envolve toda a lógica do capitalismo, mas que precisa ser iniciado.


Créditos da imagem/Desirée Ruas


Fonte: http://ecopedagogialuciana.blogspot.com.br/2016/11/entrevista-com-desiree-ruas-para-o-blog.html














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